A IPU E A IGREJA DO NOVO TESTAMENTO
Domingo, 10 de setembro de 2017

23º.  DOMINGO DO TEMPO COMUM (ANO A) 




  
Como se deve tratar um conflito
15  Se teu irmão pecar [contra ti], vai argui-lo entre ti e ele só. Se ele te ouvir, ganhaste a teu irmão. 16 Se, porém, não te ouvir, toma ainda contigo uma ou duas pessoas, para que, pelo depoimento de duas ou três testemunhas, toda palavra se estabeleça. 17 E, se ele não os atender, dize-o à igreja; e, se recusar ouvir também a igreja, considera-o como gentio e publicano. 18 Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra terá sido ligado nos céus, e tudo o que desligardes na terra terá sido desligado nos céus. 19 Em verdade também vos digo que, se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai, que está nos céus. 20 Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles.

Neste domingo a IPU comemora seu 39º. aniversário de fundação.  Foi em 1978 que um grupo de pastores, presbíteros e diáconos, homens e mulheres presbiterianos, em sua maioria expulsos da tradicional igreja presbiteriana, se reuniu em Atibaia-SP, e decidiu formar uma federação de igrejas locais que buscavam novos caminhos teológicos, doutrinários e políticos para a igreja e para o Brasil.  Aqui em Brasília somos herdeiros dessa construção.
Por isso, a leitura do evangelho de hoje vem bem a calhar. Porque, quando Mateus escreve seu evangelho, a comunidade de fé judaica está enfrentando um processo de perseguição e até de destruição. Jerusalém foi arrasada pelos romanos no ano 70, e na década de 70 do primeiro século da era cristã, milhares de judeus foram mortos, e só sobreviveram aqueles que conseguiram fugir da cidade.  Mateus escreveu seu evangelho principalmente para cristãos de origem judaica.  Eles não tinham mais o Templo de Jerusalém como local de adoração, e tinham sido excluídos da comunidade judaica pelos líderes fariseus.  Eles queriam reorganizar sua vida na condição de comunidade, mas não nas mesmas bases do judaísmo. Eles tinham uma tradição judaica; porém, uma identidade cristã. A situação histórica exigia que fosse construído algo novo. 
Vamos observar a semelhança com o que foi vivido pelos fundadores da FENIP. Na década de 70 do século XX da era cristã, havia no Brasil uma perseguição sistemática aos cristãos que afirmavam a sua fé denunciando a repressão da Ditadura militar, afirmando o diálogo ecumênico, o papel profético da igreja, etc.  Vários pastores e lideranças de igrejas foram presos ou forçados a viver fora do país.  Pastores e membros foram excluídos das igrejas, não tinham mais uma denominação, mas também não queriam construir uma igreja igual àquela a que pertenciam. A situação histórica exigia que fosse construído algo novo. 
De onde viria essa coisa nova, esse elemento, esse ar de renovação da comunidade de fé?  Tanto para os cristãos da Igreja de Jerusalém como para os de Atibaia, esse sopro de novidade veio da pessoa de Jesus Cristo.


Alguém já disse que Igreja não é aquela coisa alegre e colorida onde tudo se encaixa. O nome disse é Lego.
No futebol, quando acontece disputa de pênaltis, cinco jogadores de cada equipe se apresentam como batedores.  Quando um deles perde o pênalti, normalmente se justifica dizendo: “Só erra quem bate”.  Ou seja, só erra quem tem a coragem de se oferecer, quem se expõe à situação.  Uma vez um jogador perdeu um pênalti nessa disputa e foi logo abordado pelos repórteres.  Ele, nervoso, na hora gritou no microfone:  “Só bate quem erra!”  Ele errou a frase mas disse uma coisa muito certa.  Nenhum batedor de pênaltis é infalível, todos estão sujeitos a errar uma vez.
Igreja é comunidade humana.  Formada por pessoas.  Logo, sujeita a erros, a falhas, a desentendimentos. As pessoas que estão aqui são pessoas que erram. O texto de hoje, do evangelho de Mateus, trata exatamente dessas situações. A hora em que as pessoas erram.  Esse texto só aparece em Mateus.  É um material que este evangelista se preocupou em incluir no seu livro, para instruir a comunidade cristã judaica.
Tudo começa quando alguém diz ou faz algo que afeta outra pessoa na comunidade. Pode ter sido intencional, ou não. Pode ter sido um mal entendido.  Inicialmente, o conflito gerado entre as pessoas é trabalhado entre elas duas, de forma reservada. É um bom começo.  Quantos escândalos teriam sido evitados em todas as igrejas se primeiro a situação tivesse sido trabalhada só entre as duas pessoas, antes de ser denunciada aos quatro ventos. Antes de se promover uma cobrança na frente de quem não tem nada a ver com o assunto...
Acontece que, às vezes, as coisas não são tão simples, e a reconciliação não acontece. Aí entram aquelas pessoas da comunidade que dispõem da confiança de seus membros. Aqueles que são chamados a participar da discussão, e que servem de testemunhas do que está sendo dito.  Para se evitar disse-me-disse, alegações sem fundamento, frases capciosas etc. A finalidade dessa conversa é a busca da reconciliação, sempre. 
Finalmente, se a pessoa que está sendo questionada na sua atitude, na sua ética, nos seus valores, não chega ao entendimento com quem foi afetado por ela, então, aí sim, o assunto passa a ser da igreja. É a comunidade como um todo que vai decidir se essa pessoa está agindo como quem lhe pertence.
A pessoa só é excluída da comunidade depois de três oportunidades para se defender.  Ninguém tem o direito – nenhuma liderança – de tirar alguém sumariamente da comunidade. Esse método de três etapas não é uma coisa nova.  Ele já aparece no livro do Deuteronômio, Capítulo 19, quando a queixa de uma pessoa contra outra exige testemunhas.
Falar dessas coisas pode não soar muito simpático nos dias de hoje.  Existe uma indisposição contra tudo que lembre vigilância do comportamento, repressão, controle, tudo isso.  Creio que um grande desafio às igrejas: por um lado, não se comportar como uma agência de repressão; por outro  lado, não ter um respeito tão grande, mas tão grande, pela vida dos outros que pareça simplesmente desinteresse, e falta de zelo pelos acordos de conduta da comunidade.

18 Em verdade vos digo que tudo o que ligardes na terra terá sido ligado nos céus, e tudo o que desligardes na terra terá sido desligado nos céus. 19 Em verdade também vos digo que, se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai, que está nos céus. 20 Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles.

A decisão de uma igreja é muito importante.  Tão importante que ela tem reflexos nos céus. É isso que nos diz o evangelista, em três situações, pelo menos:  quando estabelecemos um vínculo entre as pessoas; quando oramos juntos; e quando nos reunimos.
No judaísmo, uma cerimônia só é válida com a presença de dez homens adultos (acima dos 13 anos de idade).  Aqui dois ou três são suficientes para realizar uma celebração ou assumir um compromisso.
No judaísmo, há uma frase que diz que quando duas pessoas se reúnem para estudar a Torah (o livro da Lei), a Shekinah divina (a presença de Deus) está com elas.  No evangelho, a torah é o nome de Jesus, e a presença de Deus é a presença de Jesus Cristo em nosso meio.  Que coisa maravilhosa.
Ser recebido em nossa igreja, ser ordenado a um ministério, não são apenas questões da burocracia eclesiástica. São compromissos cósmicos.  Precisam ser levados a sério.  Um diácono, uma diaconisa, um presbítero, uma presbítera, são ordens que existem na igreja e existem diante de Deus também.  Pastores e pastoras, a mesma coisa.  Não se deve brincar com essas coisas.
O mesmo ocorre quando a igreja ora por alguma coisa.  Nós temos a experiência da oração comunitária.  Deus ouve as igrejas. Deus ouve a nossa igreja, independente do nosso tamanho.
Cremos que, após 39 anos, essa é a igreja que a IPU quer construir.  A igreja da unidade, da reconciliação, do compromisso e da presença de Deus.


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